sexta-feira, 24 de junho de 2011

Por uma nobre causa

Por Érico Veríssimo - Acadêmico de Jornalismo da Universidade Federal de Roraima (UFRR) e metido a blogueiro de vez em quando

Texto publicado originalmente no Blog: http://blogdoericoverissimo.wordpress.com


Érico Veríssimo
Uma emenda à Lei Orgânica do Município de Boa Vista aumenta o número de vereadores para 21, conforme reza a Emenda Constitucional de número 58, promulgada em 2009. Segundo a Carta Magna, municípios com mais de 160 mil e até 300 mil habitantes podem ter, no máximo, esse número de edis. A capital roraimense tem mais de 280 mil habitantes e 14 “representantes do povo”.

Com salários em torno de R$ 6 mil, o rendimento mensal de cada vereador ultrapassa os R$ 20 mil com a “ajudinha” da verba de gabinete e outros penduricalhos. Somem-se a essa renda os “trabalhos por fora” que, se não são todos, a maioria tem, e a “profissão” de vereador se torna uma das mais atraentes, ainda mais se levarmos em conta que não há muitas outras opções de “emprego” em nossa cidade.

Constantemente ouvimos reclamações dos políticos locais em relação à situação financeira do Estado e do município, que anda de mal a pior e as respectivas administrações não conseguem pagar suas contas em dia. Há atraso nos salários dos servidores municipais e estaduais, cancelamento de eventos festivos, falta de investimento e a permanente incerteza de comando nas duas esferas (quem entra?, quem sai?, quem manda?, quem desmanda?). Contenção de despesas, cortes de funcionários e atrasos nos pagamentos quase sempre são atribuídos à “maldita” redução do FPM (Fundo de Participação dos Municípios) e do FPE (Fundo de Participação dos Estados).

Em que pesem as circunstâncias, o aumento do número de cadeiras na Câmara Municipal, embora sustentado constitucionalmente, soa como um tapa na cara dos munícipes que sofrem com as mazelas que, normalmente, só são vistas em período eleitoral. O resto do ano é dedicado ao abandono e às causas particulares dos eleitos, muitos dos quais utilizam o cargo como trampolim para vôos mais altos. Não adianta a desculpa de que essa medida “não oneraria as contas do município, pois está tudo previsto no Orçamento, não comprometendo as contas públicas e seria feito apenas um remanejamento para abrigar os novos colegas…”.

Para a população, pouco importam os motivos alegados. O que interessa, de fato, é que a realidade dos nobres edis é bem diferente daquela dos pobres mortais que, dificilmente, se sentem “representados” por eles e costumam assistir, nas parcas sessões das “Casas do Povo”, a discussões de tamanha irrelevância e sem efeito prático na vida do cidadão comum, a exemplo de votações para mudança de nome de ruas, homenagens a “ilustres” moradores e outras coisas afins.

Muitos alegarão que lutam pelos menos favorecidos, fiscalizam o Executivo, legislam a favor do município e o interesse pelo bem comum está acima de tudo. Talvez possamos dar um voto de confiança a alguns “gatos pingados” que não fazem do cargo de vereador uma “profissão”, um meio de vida.

Se a vontade do povo é sempre lembrada em momentos decisivos e a opinião pública influencia os bastidores políticos (como nos fazem crer), não seria mais interessante se os senhores “representantes do povo”, em favor de uma nobre causa e em vez de se preocuparem em aumentar o número de cadeiras na Câmara, abrissem mão dos seus salários e agissem como voluntários ou meros conselheiros municipais?

Com esse gesto, eles abririam um precedente para que deixássemos de ser um dos últimos países a pagar salário a vereador, além de favorecê-los com tantas outras regalias, mesmo que trabalhem muito menos do que um reles mortal e recebam muito acima da média dos que ganham razoavelmente bem.

P.S.: Há um site chamado “Transparência Municipal” (http://www.oim.tmunicipal.org.br/) que disponibiliza um documento chamado “Remuneração dos Vereadores e Jornada de Trabalho”. Está em “Dados Municipais”. Ainda que seja de março de 2010 e se refira aos salários de 2005 com projeção de aumento até o ano passado, vale a pena dar uma olhada, especialmente na página 4, onde estão os dados sobre Roraima. Lá estão jornadas de trabalho dos dedicados vereadores, à exceção de Amajari, Pacaraima e Uiramutã que não deram informações.

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